Multipropriedade
O regime da Multipropriedade nos Condomínios Edilícios e o Registro de Imóveis
Franciny Beatriz Abreu
Registradora Pública
Comarca de Porto Belo
(Municípios de Bombinhas e Porto Belo – SC)
A Lei 13.777, de 20 de dezembro de 2.018, trouxe alterações ao Código Civil e à Lei 6.015/73, criando o instituto da Multipropriedade no Brasil.
Tal instituto começa a ser usado, especialmente pelos incorporadores imobiliários de cidades turísticas, colocando-se no mercado de imóveis um novo produto: a cota ou fração de tempo de um determinado imóvel, a ser utilizada, em regra, para fins de lazer, que terá no mínimo a duração anual de uma semana ou sete dias, sendo estes consecutivos ou alternados.
Essa fração de tempo corresponde à faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada.
Em face do novel instituto, é necessário tecer alguns esclarecimentos no tocante ao procedimento a ser utilizado no Registro de Imóveis, para que não pairem dúvidas ao usuário do Sistema, especialmente em Santa Catarina.
Inicialmente, cabe esclarecer que na fase da incorporação imobiliária não há como instituir o regime da multipropriedade, só após o registro da instituição do condomínio, com o nascimento dos respectivos imóveis (unidades) sujeitos a tal regime futuro.
Sem imóvel não há multipropriedade!
Assim, havendo a intenção futura de que o empreendimento siga o regime de multipropriedade, trata-se de direito futuro, condicionado à conclusão da obra e registro da instituição de condomínio e de sua Convenção (onde deverá haver previsão normativa autorizando a instituição da multipropriedade).
Isso porque, antes da instituição da multipropriedade faz-se necessário nascer as matrículas para cada unidade, na forma do que prevêem o art. 1331 e seguintes do Código Civil e Lei 4591/64 e o princípio da continuidade registral (arts. 195 e 237 da Lei 6.015/73).
Está claro, portanto, que havendo a intenção de se colocar à venda no mercado uma expectativa de direito: as cotas ou frações de tempo relativas a unidades em construção, é necessário efetuar o registro da incorporação imobiliária do Condomínio Edilício, constando na minuta da futura convenção tal possibilidade e inclusive determinando se o Condomínio Edilício como um todo sujeitar-se-á ao regime da Multipropriedade, ou se o empreendimento será misto, como autoriza a novel legislação, bem como prevendo a quantidade de cotas ou frações de tempo que serão criadas futuramente para cada unidade condominial.
Outrossim, considerando que no Estado de Santa Catarina, a abertura de matrículas para as futuras unidades condominiais será realizada tão somente no ato e da instituição do condomínio, como prevê o Código de Normas (art. 662), as eventuais promessas de compra e vendas realizadas durante a fase da incorporação imobiliária, serão registradas na matrícula mãe do empreendimento, devendo cada Ofício de Registro de Imóveis efetuar rigoroso controle das alienações, a fim de assegurar a segurança jurídica necessária, evitando a duplicidade de registros para a mesma fração de tempo de determinada unidade.
Tal controle é fundamental porque, considerando que a cota ou fração de tempo de um determinado imóvel terá no mínimo a duração anual de uma semana ou sete dias – consecutivos ou alternados – há a possibilidade de se efetuar até 52 (cinquenta e dois) registros de alienação (promessas) para cada unidade condominial futura (imóvel) e o controle desses atos é responsabilidade da Serventia.
Dito isso, não há dúvidas de que somente a partir da instituição do Condomínio Edilício é que será possível efetuar o registro da multipropriedade no Registro de Imóveis.
Havendo intenção de criar a multipropriedade já no ato da instituição do condomínio edilício, poderá ser apresentado ao Registro de Imóveis instrumento único – que obrigatoriamente será público (Escritura lavrada em Notas de Tabelião Público – art. 108 cc), já que a fração de tempo ganhou “status” de direto real ao receber por lei uma matrícula e a multipropriedade é uma nova forma de condomínio civil, e ainda, o empreendimento terá valor evidentemente superior a 30 (trinta) salários mínimos vigentes no Brasil.
Este instrumento único deverá conter todos os requisitos para a instituição do condomínio edilício – com previsão da permissão da instituição da multipropriedade – paralelamente aos requisitos previstos em lei para a instituição da multipropriedade; sendo cada instituto jurídico (condomínio edilício e multipropriedade) tratado como ato próprio e separado no corpo da mesma Escritura.
Pode, também, o interessado optar por instrumentos distintos, desde que seja lavrada Escritura Pública para a instituição da multipropriedade.
Neste caso, também a Convenção (do Condomínio e da Multipropriedade) poderá ser lavrada em um único instrumento – observando-se para suas confecções o que está previsto na Lei 4591/94, arts. 1332 e ss. (Condomínio) e art. 1358 – G, do Código Civil (Multipropriedade).
Serão dois os registros na matrícula-mãe (L2): o da instituição de Condomínio e o da instituição da Multipropriedade; e um registro da Convenção no L3, além de sua necessária averbação na matrícula-mãe do empreendimento.
Em cada unidade condominial (imóvel) criada pelo registro da instituição do Condomínio Edilício, sujeita ao regime da multipropriedade, será averbada a criação das matrículas das cotas ou frações de tempo, tantas quantas forem previstas no instrumento de instituição.
Essa é a previsão dos parágrafos 10 e 11 do art. 176 dizem que:
“§ 10. Quando o imóvel se destinar ao regime da multipropriedade, além da matrícula do imóvel, haverá uma matrícula para cada fração de tempo, na qual se registrarão e averbarão os atos referentes à respectiva fração de tempo, ressalvado o disposto no § 11 deste artigo.
§ 11. Na hipótese prevista no § 10 deste artigo, cada fração de tempo poderá, em função de legislação tributária municipal, ser objeto de inscrição imobiliária individualizada”.
Assim, deve-se primeiramente registrar na matrícula-mãe a instituição do condomínio e somente após, a instituição da multipropriedade, que poderá abarcar o empreendimento todo ou algumas unidades.
Em cada unidade condominial sob regime de Multipropriedade será averbada a existência do registro da multipropriedade na matrícula mãe, com a menção também do registro da convenção da multipropriedade no L3.
A multipropriedade também pode ser instituída em Condomínios Edilícios já criados, desde que haja decisão nesse sentido da maioria absoluta dos proprietários das unidades, em assembleia geral especialmente convocada para tal fim. Neste caso, será apresentada ao Registro de Imóveis a alteração da Convenção condominial, prevendo permissão da submissão do empreendimento como um todo ou de algumas unidades ao regime da multipropriedade, alteração que será averbada à margem da matrícula-mãe do empreendimento (L2) e no L3, respectivo.
Deverão ser apresentadas, também, além da Convenção de Condomínio alterada, a ata da Assembleia que aprovou a respectiva alteração e lista de presença com a assinatura da maioria absoluta dos titulares das frações ideais, acompanhadas de edital de convocação, bem como a Escritura Pública de instituição da Multipropriedade, com a respectiva Convenção estipulada em ato próprio da mesma Escritura (ou em ato apartado), que siga os ditames previstos em Lei, para que possam ser efetuados os devidos registros e averbações no Registro de Imóveis.
Para extinguir a multipropriedade, deve ser utilizada a escritura pública, mesma forma da instituição (art. 108 CC), pois a multipropriedade não se extingue automaticamente, mesmo quando o mesmo proprietário passar a ser o dono de todas cotas ou frações de tempo (parágrafo único do art. 1358 – C).
E, evidentemente, quando se tratar de Condomínio Edilício, a extinção do regime da multipropriedade somente pode ser geral, porque criada em conjunto por instrumento coletivo, respeitando o quorum previsto na convenção. Isto é, não há como um só proprietário de uma unidade (que adquiriu todas as cotas tempo daquele imóvel) desligar-se sozinho do regime da multipropriedade, salvo se a convenção permitir.
Havendo extinção do regime da Multipropriedade em Condomínios Edilícios, deve ser apresentada ao Registro de Imóveis a ata da Assembleia que aprovou a extinção pela maioria absoluta dos titulares dos direitos reais, ou quorum superior previsto em Convenção, edital de convocação e lista de presença, bem como o novo texto da Convenção de Condomínio Edilício, excluindo as regras relativas à multipropriedade, alteração que será averbada no L3 e no L2, e implicará na extinção das matrículas criadas para as cotas ou frações de tempo relativas a cada imóvel (unidade condominial).